Cedo percebi que se não quisesse ter os resultados do meu trabalho restringido as 24h do meu dia, eu teria que aprender a delegar. Foi um dos meus primeiros desafios da transição de trabalhador individual para gestor e certamente um dos mais difíceis de superar. Até hoje preciso me policiar para entender se não é hora de delegar algo para os meus liderados, tanto porque eles estão prontos para assumir novas demandas ou porque estou precisando focar em algo novo e já estou sobrecarregado.
Achei difícil começar a delegar pois no inicio de carreira eu era cobrado pela minha execução individual. Gostava de fazer as coisas com minhas próprias mãos porque tinha a a certeza de que iria fazer bem feito e a confiança de que se algo desse errado no caminho eu acharia um jeito de resolver. Foi uma quebra de paradigma grande passar a tarefa adiante e abrir espaço para toda a incerteza de ter outra pessoa executando no meu lugar, porém com a entrega do resultado seguindo sendo responsabilidade minha. Era comum inclusive eu não delegar usando desculpas como a falta de tempo para explicar como deveria ser feito ou o medo de que a pessoa executasse do jeito errado e eu tivesse que ir lá resolver, me tomando mais tempo.
Com a experiência fui percebendo que o processo de delegar nada mais é que um processo de treinamento. Percebi também que os benefícios de passar as tarefas adiante superavam em muito o esforço de treinar quem me substituiria na execução. Isso porque o grande esforço é ensinar das primeiras vezes e depois com um tempo mínimo de acompanhamento tenho a certeza que a tarefa segue sendo bem feita. Percebendo o quão benéfico era treinar outras pessoas para assumir minhas tarefas, passei a procurar formas de fazer isso com menos esforço e mais eficácia.
Conforme fui fazendo testes, percebi que existem muitas formas de delegar. Normalmente o fator que define o modelo de passar a tarefa adiante será a experiência no contexto da execução de quem está sendo treinado. Quanto maior a experiência, maior pode ser o escopo que você delega e maior a autonomia que você pode dar. Porém aqui quero focar no desafio inicial que encontrei como gestor: delegar demandas bem definidas, que eu estava conseguindo executar bem, porém que eu podia passar adiante porque já tinham pessoas preparadas no time para assumir.
Através das experimentações acabei chegando em um método simples para servir de norte sempre que preciso delegar. Primeiro eu defino bem o que é a demanda e como eu executo. Isso porque durante o processo de execução muitas vezes não percebemos todos os passos que tomamos até a conclusão da tarefa. De tanto que já realizamos, entramos no piloto automático e executamos sem nem pensar no que estamos fazendo. Logo antes de passar adiante eu analiso o passo a passo que sigo e documento de uma forma que seja compreensível para quem será treinado entender.
Depois disso, procuro dentro do time qual é a melhor pessoa que tenho disponível para executar essa tarefa. Acredito que para a execução ter um resultado satisfatório é necessário uma combinação de conhecimento e motivação, a pessoa precisa “querer fazer“ e “saber fazer”. Para cada demanda, tento encontrar alguém que tenha o conhecimento e motivação necessário para conseguir gerar um bom entregável.
Entendendo bem o que quero delegar e pra quem quero delegar, é a hora de treinar a pessoa escolhida. Inicialmente é necessário que haja um bom alinhamento e que a pessoa entenda qual o resultado é esperado dela. E além disso, entendo que os melhores resultados no processo de treinamento se dão quando acompanhamos a pessoa na execução das tarefa e damos feedback com base nas ações dela. Assim normalmente sigo essa sequência de passos: mostrar, acompanhar e delegar.
Primeiramente mostro pra pessoa como eu executo a tarefa. Deixo ela assistindo a minha execução e peço pra ela que ela anote dúvidas. Por exemplo: quando quero treinar alguém sobre como eu conduzo alguma reunião que acontece com frequência, eu levo a pessoa de ouvinte na reunião. Depois sento com ela explicando o racional por trás de como fiz a condução e respondo todas as duvidas dela. Mais do que simplesmente a pessoa me ver executar, é importante que ela entenda a linha de pensamento que eu segui. Isso é importante para que ela não seja somente uma repetidora, mas sim para que forme a própria linha de raciocínio e assim esteja preparada para se o cenário não se repetir exatamente como ela foi treinada. Repito esse passo até que a pessoa esteja se sentindo segura para ela mesmo executar a demanda.
O segundo passo é acompanhar a pessoa na execução. No caso da reunião, combino com ela que ela irá conduzir e eu vou estar junto de ouvinte. Alinho também que caso ela sinta dificuldade em conduzir alguma parte especifica é só me passar a palavra que sigo de onde ela parou. O fato de eu estar acompanhando normalmente da a segurança necessária para a pessoa conduzir a reunião sozinha, porém caso eu veja que a reunião não está indo para um lado bom eu estou ali e consigo interceder. Depois da reunião, de novo sento junto com a pessoa e peço dessa vez para ela me explicar o racional dela por trás da condução da reunião e fico aberto pra tirar duvidas. Conduzo dessa forma até que eu consiga participar da reunião sem precisar interceder e sem a pessoa passar a palavra pra mim.
A ultima etapa é efetivamente delegar. No caso da reunião, deixo a pessoa conduzir sozinha, sem minha participação. Após a reunião sento com ela pra entender como foi. Caso tenha tudo funcionado bem, ela está apta pra ficar responsável pela tarefa dali pra frente. Caso não, dou um passo atrás e volto a participar junto vendo ela executar.
Porém o processo de delegar não para ai. É importante relembrar que delegar não é abandonar. É responsabilidade do gestor se certificar de que tudo que ele delegou segue atingindo os resultados esperados. Por isso é importante montar uma estrutura de acompanhamento através de indicadores ou de relatórios. No exemplo da reunião uma possibilidade é combinar que a pessoa responsável mande uma ata da reunião por email comigo em cópia após sua finalização. Somado a isso, de tempos em tempos é importante ir enxergar a execução com próprios olhos para se certificar que realmente segue funcionando bem.
Quando consigo passar por esse processo considero que deleguei de forma eficaz. Não é um trabalho simples de ser feito, porém os resultados sempre se pagam a partir do momento que consigo ver a demanda se manter sendo executada com qualidade com um baixo esforço meu. Sem contar todo o beneficio que isso gera para quem fica responsável, pois aumenta sua área de impacto na organização enquanto assume um novo desafio. Hoje estou adquirindo o hábito de constantemente passar pelas minhas demandas e entender se não tem algo que tá na hora de ser delegado. Assim eu ganho por ter mais tempo para explorar novas possibilidades e o time ganha por se manter em constante evolução.